quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Paul Auster



Um trecho de Sunset Park...
A alegria de olhar seu rosto outra vez, a alegria de abraçá-la outra vez, a alegria de ouvir seu riso outra vez, a alegria de ouvir sua voz outra vez, a alegria de vê-la comer outra vez, a alegria de olhar para suas mãos outra vez, a alegria de olhar para seu corpo nu outra vez, a alegria de tocar seu corpo nu outra vez, a alegria de beijar seu corpo nu outra vez, a alegria de vê-la franzir as sobrancelhas outra vez, a alegria de vê-la escovar o cabelo outra vez, a alegria de vê-la pintar as unhas outra vez, a alegria de ficar debaixo do chuveiro com ela outra vez, a alegria de conversar com ela sobre livros outra vez, a alegria de ver seus olhos se encherem de lágrimas outra vez, a alegria de vê-la andar outra vez, a alegria de ouvi-la xingar Angela outra vez, a alegria de ler em voz alta para ela outra vez, a alegria de ouvir seu arroto outra vez, a aleg... ria de vê-la escovar os dentes outra vez, a alegria de tirar sua roupa outra vez, a alegria de colocar a boca sobre a sua boca outra vez, a alegria de olhar seu pescoço outra vez, a alegria de caminhar pela rua com ela outra vez, a alegria de pôr os braços em volta dos ombros dela outra vez, a alegria de lamber seus peitos outra vez, a alegria de penetrar em seu corpo outra vez, a alegria de acordar ao lado dela outra vez, a alegria de discutir sobre matemática com ela outra vez, a alegria de comprar roupas para ela outra vez, a alegria de massagear e ser massageado outra vez, a alegria de falar sobre o futuro outra vez, a alegria de viver no presente com ela outra vez, a alegria de ouvi-la dizer que o ama outra vez, a alegria de dizer para ela que a ama outra vez, a alegria de viver debaixo de seus olhos escuros e ardentes outra vez, e depois a agonia de vê-la embarcar no ônibus na rodoviária de Port Authority na tarde do dia 3 de janeiro, com a certeza de que só em abril, daqui a mais de três meses, ele terá a alegria de estar com ela outra vez.
De Paul Auster.


Por questão de honestidade,cito o link de onde tirei o texto acima,foi do blog de Tiozinho que sempre acesso gosto muito:

http://www.tiozinhodafoto.blogspot.com.br/?zx=883ddd639f38ff92



segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Pra mim





O que pode nos deixar mais comovido e emocionado do que um depoimento de uma amiga sobre a gente,ainda mais quando se trata de uma pessoa da nossa estima e que sabe escrever com a delicadeza que só os grandes escritores tem.Eu tive o enorme prazer de ter sido pesenteada com um belíssimo texto de Nivaldete,e confesso fiquei emocionada,confiram:



T T

Ela manda por e-mail textos curtos de pessoas que, de algum modo, escrevem com sangue
("escreve com sangue e verás que sangue é espírito" -impossível não trazer Nietzsche aqui). Sabe escolher, tem faro para essas escritas 'vermelhas', aquelas em que seus autores se mostram sem pudor, mostram as feridas, riem delas, se confessam arruinados naquele momento, quebram coisas na linguagem, se descabelam, choram e prosseguem com um riso irônico.
Se somos o que comemos, como dizem, Tetê ( T T) Bezerra é o que lê e as músicas que ouve. Aqui não há sectarismo: tanto um violonista sofisticado quanto um brega dor-de-cotovelo-deslavada. Pra ouvir alto, enquanto o gole de cerveja desce pela garganta. Doce boêmia, embora cerveja amargue -e não seria cerveja se não amargasse, ela diria. Porque sabe achar ditos circunstanciais adequados.

Sabendo o nosso gosto, grava CDs de Drummond dizendo poemas e nos dá como presente de aniversário, uma letrinha azul indicando do que se trata. "Gravei pra você, é seu, guarde, depois você ouve".
Seus agrados são assim: de quem conhece aquele/a que recebe o que recebe. 
 

 Delicadezas de T T, que ama cachorros e gatos. A sua gata Aninha tem também sobrenome: Bezerra. O cachorro Nino, que não tinha pelos, mas cabeleira arruivada, já foi...

Um tempão sem vê-la e é aquela mesma montanha de gente -grande e forte nos dois sentidos: no corpo e na forma de estar presente, de adivinhar a pessoa de cada pessoa e falar de coisas próprias do mundo de cada uma. E o corte e a mecha branca no cabelo lembram Susan Sontag. Digo sempre. Ou vez por outra, pois é vez por outra que a gente se acha, quase sempre nas comemorações familiares. Ainda bem.

T T esquiva-se de misturar amizade com política, por ex. Ou faz parte de sua política, já que política vem de polis, cidade, e a cidade é também o lugar 3x4 onde se está com outros, e é preciso saber estar; ela sabe. Sabe que encontrar amigos é semelhante a um devaneio, e devaneios não devem ser afugentados com discussões dessa ordem.

Ela se mostra quase surpresa porque damos retorno aos seus envios de textos: um comentário ligeiro e ela se sente tocada. Ora, T T, essas pequenas éticas são o mínimo que você merece, mas respondemos também porque igualmente nos toca termos sido lembrados.

Faça de conta que eu ainda tomo cerveja, T T. Então vai uma 'ceriveja' aí (na minha pronúncia lá de Nova Palmeira, nossa terra)?...
Tim-tim por você! Até mais depois.

P.S. Escrevi pra você, não guarde, nem precisa ler. Você sabe já isso tudo.


http://lapisvirtual.blogspot.com.br/2012/11/t-t.html#comment-form

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Ticcia





Aprendi a amar sob o signo do efêmero, avisada de que a qualquer momento podia me flagar vivendo de mentira ou despencando de uma torre muito alta que a mim não pertencia. Alfabetizei o peito e os olhos para acolher o adeus a qualquer momento e por qualquer motivo, em muitas línguas, de muitas formas, mesmo sussurrado em ausência e silêncio. Eduquei os braços para o regresso do vazio e os pés para dar meia volta e seguir noutra direção, como se o amor fosse frágil, perecível, volátil, fugidio, como se eu nunca fosse capaz de fazê-lo vingar, ou não merecesse permanência, mais que uma miragem, um presságio, um trailer. Peço perdão se não sei mergulhar no que para mim sempre foi um poço raso demais. Para isso é preciso mais que certezas. Para isso é preciso fé.
(Escrito por Ticcia)

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

PAULO HENRIQUES BRITTO




Hoje acordei bem prático, sofístico,
sem pudores de lógica e moral,
fechado em mim, feito uma ostra, um dístico
ou uma pedra (mas não filosofal).
Devia haver mais dias como este,
livres de compromissos com dois mil
anos de ocidentalismo, a nordeste,
a sul, a sotavento do Brasil
ou do que quer que seja. Simplesmente
ser, sim, mas contingência pura, só,
nada que deixe um rastro ou excedente
em sangue, fezes, páginas ou pó.
Dias de amarrar barbante ao redor
do nada, e capturar um deus menor.

(de Cinco Sonetos Frívolos; in Formas do Nada)