terça-feira, 5 de julho de 2011

Sorriso Maroto


Sabe? Nesses tempos meio desesperançados, meio doidos e doídos, preciso fazer uma confissão pública: tenho inveja de quem não tem seguidor, não defende uma reputação, não segue qualquer escola de pensamento, não se filiou a um partido político, não precisa vestir paletó (fato, irmãos portugueses), não guarda dinheiro na poupança, não tem eira nem beira.
Puxa, como deve ser gostoso sentar e escrever o que quiser sem precisar explicar que continua coerente com o que redigiu há seis anos. Quando crescer ainda vou ser um anarquista! E quando morrer quero que o meu céu seja bem bagunçado, cheio de gente conversando, lotado de mesas desarrumadas e sem etiqueta social. Quero ser recebido por um anjo com a camisa para fora das calças e de chinelo. (Lá, vou palitar meus dentes sem cobrir a boca).
Penso em começar a escrever usando um pseudônimo. Talvez eu vá me chamar de “Zé Alguma Coisa” – ou talvez opte por um nome árabe, já que os escritores de lá ganham muito dinheiro empinando pipas. Se algum dia eu me tornar um “Zé Alguma Coisa” vou anarquizar com todo mundo, começando por mim mesmo e elogiar os que não merecerem.
Quero ter a liberdade de xingar as imbecilidades religiosas, falar de perdão para os piores pecadores e oferecer esperança para os tipos mais estranhos. Para isso, vou valer-me de metáforas insanas e de argumentos bem absurdos.
Prometo assumir minha legítima verve cearense. Ainda vou tornar-me um repentista, comediante ou romancista regionalista. Ambiciono transitar desde o José de Alencar até o Tiririca. Ora, na minha terra, que é seca, até o sol é vaiado quando rompe com as nuvens e estraga a perspectiva da chuva. Sendo assim, espero poder vaiar quem eu quiser - inclusive a mim mesmo.
Vou apupar os professores que papagaiam teologias sistemáticas redondinhas, copiadas de compêndios fundamentalistas da década de 1940. (acontece que já não agüento teorias que mostram um Javé sanguinário, que antes das pessoas nascerem, as condenou ao fogo eterno); vou zombar dos “levitas” emplumados que tentam parecer com os artistas da Globo; vou rir dos “apóstolos”, especialistas em curar caroços do corpo.
Ainda hei de voltar a dormir com meu sorriso maroto da adolescência - chega de cenhos franzidos. Sinto que a vida tem que ser levada mais na esportiva, na “maciota” como dizem os boêmios, e é assim que almejo encarar meus últimos dias: sem a sofreguidão dos austeros ambientes farisáicos.
Ah, como tenho ciúmes de quem se rodeia de amigos que sabem fazer batucada na mesa, transformando cada refeição numa gostosa farra enquanto se abraçam publicamente.
Quero aprender a usar a vida como argamassa para minha pobre poesia. E se alguém rotular-me de maluco, responder com uma gostosa risada; se avisar que perdi o senso, aplaudir; se advertir que caminho para a perdição eterna, agradecer com um beijo na testa.
Sem lenço, sem documento, sem peso nos ombros e sem culpas persecutórias, vou assumir minha Ricardice - dizem que isso previne vários tipos de câncer.
Soli Deo Gloria.

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