"Feira Hippie, BH" Pintura de Jean Paulo
Não
encontrei o mar revolto em Pessoa, mas vi em Hilda Hilst seu jeito
destemido de ser tão obscena e obcecada. Não fui moça casadoira como
Adélia Prado, eu me inseri na babilônia da lascívia de Anais Nin, entre a
loucura, a delícia e a razão fantasiada. Eu quis salvar a vida de Ana
C. que virou passarinho em Manoel de Barros. Estive com Clarice, Caio e
Mia Couto, mas quis que Guimarães me amasse qual neblina Diadorim: faltou meu Riobaldo, um rio nosso, terra seca e a boca molhada de neologismos pra mulher amada.
(Fui quase injusta em desejar que as coisas tivessem sempre um real
tamanho, que as fomes fossem saciadas sempre pelo melhor gosto, que a
chuva só desabasse em tempos de matar a sede.) Tranquei meus dias ruins
nas cores de um Miró aceso. Fui tão constrangedora não sendo infeliz
como escritora, preferindo de qualquer maneira a incerteza da existência
da verdade inteira. Se quase sucumbi num poço de tristeza, me reergo
até hoje, constante e amiúde, fazendo o meu melhor_ fiz o maior que
pude. Mas não me preservei: ainda sou lanhada pelos galhos de matas
fechadas que são o meu altar, minha estrada.
Engulo o amargo da
saudade sem fazer careta, absorvo o azedo da rejeição sem me achar
menor, abro os braços para a escuridão contando estrelas, gasto cada
gota de suor e sangue nas minhas entregas. E não economizo gargalhadas,
mas pago o preço alto do inconveniente de viver no mundo paralelo e
metafísico onde vivem as palavras.
Estive em muitas páginas. Grifei muitos parágrafos. Sorvi tantas inglórias e orgasmos e vitórias.
E estive com você além de mim. Fui burra, mas foi bom. Fui pura, mas
fui tola. E toda a malícia vinda na hora inadequada me fez desconfiada
por tudo, por nada.
Eu tenho um jeito enorme de amar pra sempre, mas sou desajeitada.
Eu tenho um jeito imenso de ser comovente, mas sempre concluo as histórias na hora errada.
Marla de Queiroz
Nenhum comentário:
Postar um comentário