quarta-feira, 4 de setembro de 2013

Regis Bonvicino

Caminho de hamster



Fedendo a cigarro e a mim mesmo
cruzo uma avenida
ao anoitecer
sirenes, carros

vozes abafadas
avenida larga e áspera
numa rua transversal
o cadáver de um cachorro

atropelado
rodas metálicas em ritmo lento
fedendo a esgotos e a mim mesmo
a um pouco de fogo, do isqueiro

fedendo como aquela maçã podre
fedendo a música estúpida
desses tempos
e a mim mesmo

o lixo recolhido exala
um cheiro nítido na calçada
fedendo a sapatos e a mim mesmo
a ratos, ao suor dos néons

a cadeiras e a mim mesmo
a notícias inúteis e a mim mesmo
fedendo sob a lua
narinas entupidas de gás carbônico

o som do motor do ônibus
fedendo as mesmas camisas
fedendo a miopia e a mim mesmo
fedendo a esquinas

exalando cheiros
fedendo a expectativas
que no entanto acabam
na próxima linha

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