terça-feira, 23 de novembro de 2010

Lançamento livro João da Rua


Convite
Lançamento do livro:

O VENENO DO SILÊNCIO (Edições Sebo Vermelho)
Poemas
João Batista de Morais Neto

Local: IFRN - Cidade Alta
Dia 24 de novembro
Às 16h

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

O que você perde com um cachorro


Desde que os conheci, perdi horas de sono, sapatos, papéis importantes, vasilhas, fios, livros.... Perdi a liberdade de deixar minhas coisas espalhadas por onde quisesse. Perdi tempo limpando sujeiras pela casa, no sofá, na cama. Desde que os conheci, perdi a voz repetindo por centenas de vezes “não pode!”. Perdi a paciência, repreendi, xinguei, eduquei. Desde que os conheci perdi a hora de sair me justificando para eles que logo voltaria. Perdi também a liberdade de receber qualquer pessoa em casa, pois para entrar é obrigatório que goste de cachorros.


Desde que os conheci, perdi a paz de sair de casa e passei a me preocupar com o tempo que passava fora, a sentir o coração apertado ao ir trabalhar e a me culpar por sair para o lazer sem levá-los. Quem tem um cachorro, sabe exatamente do que estou falando. Só que no meu caso, todas a emoções foram multiplicadas por três.


Na dor angustiante de perder uma grande companheira, a Lua, uma cadelinha que ficou ao meu lado por 11 anos, assumi a responsabilidade de adotar três filhotes. Amor por animais sempre senti, mas a princípio os adotei para minimizar o vazio gigantesco da partida de minha grande amiga. Pois bem, os três chegaram bagunçando a minha casa toda novinha, mordendo e roendo móveis, espalhando xixi por todo o canto. Mesmo com todos os contras, os prós foram maiores. Eram três bolinhas peludas, carinhosas e carentes.


Meus novos bebês pediam atenção praticamente durante todo o dia. Os gastos iniciais com vacinas e veterinários não estavam calculados, mas vamos lá. Os gastos com a reposição de tudo que estragaram também não foram planejados, mas paciência.... Os olhinhos fixos aos meus, em vigilância constante de meus passos, foram a prova do que eu já imaginava: represento tudo na vida deles. Além de amor incondicional, devotam enorme confiança no que ofereço e faço, sem jamais questionarem a procedência do que dou para comer, beber ou brincar. Mais que amor, idolatria. Com isso, também me ensinaram. Nunca fui tão importante em minha vida. Mesmo no caso da Lua ou da Kika, minhas primeiras cachorras, pois na casa de meus pais eu era só mais uma. Agora eu sou realmente tudo para esses pequenos e adoráveis seres. Claro que tem meu marido, mas me sinto a mãe desses filhotes, que retribuem com um amor incondicional que filho algum conseguiria ter.


Desde que os conheci, já não conto o valor do que destroem, mas a alegria de vê-los crescendo. Desde que os conheci, tenho a certeza de que pagaria o preço que fosse para vê-los felizes. Desde que os conheci, descobri em mim uma capacidade enorme de amar e de abrir mão de qualquer objeto, me preocupando apenas se aquilo que mastigaram pode fazer mal. O que estragaram, compro de novo, contanto que estejam bem. Se você não gosta ou não tem um cachorro, não sabe o que está perdendo. Não faz nem ideia....
Letícia Murta @leticiamurta

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Antônio Maria


CONVERSA DE PAI E FILHA

Antônio Maria

- Pai, eu tenho um namorado.

Pai, que ouve isso da filha mocinha, pela primeira vez, sente uma dor muito grande. Todo o sangue lhe sobe à cabeça, e o chão do mundo roda a seus pés. Ele pensava, até então, que só a filha dos outros tinha namorado. A sua tem, também. Um namorado presunçosamente homem, sem coração e sem ternura. Um rapazola banal, que dominará sua filha. Que a beijará no cinema e lhe sentirá o corpo, no enleio da dança. Que lhe fará ciúmes de lágrimas e revolta; pior ainda, de submissão, enganando-a com outras mocinhas. Que, quando sentir os seus ciúmes, com toda a certeza, lhe dirá o nome feio e, possivelmente, lhe torcerá o braço. E ela chorará, porque o braço lhe doerá. Mas ela o perdoará no mesmo momento ou, quem sabe, não chegará, sequer, a odiá-lo. E lhe dirá, com o braço doendo ainda: “Gosto de você, mais que tudo, só de você.” Mais que de tudo e mais que dele, o pai, que esse porcaria de rapaz fará a filha mocinha beber whisky, e ela, que é mocinha, ficará tonta, com o estômago às voltas. Mas terá que sorrir. E tudo o que conseguir dela será, somente, para contar aos amigos, com quem permuta as gabolices sobre suas namoradas. Ah! O pai se toma de imensa vontade de abraçar-se à filha mocinha e perdir-lhe que não seja de ninguém. De abraçá-la e rogar a Deus que os mate, aos dois, assim, abraçados, ali mesmo, antes que torça o bracinho da filha. Como é absurda e egoisticamente irracional o amor de pai! Mais que ódio de fera. Ele sabe disso e se sente um coitado. Embora sem evitar que todos esses medos, iras e zelos passem por sua cabeça, tem que saber que sua filha é igual à filha dos outros; e, como a filha dos outros, será beijada na boca. Ele, o pai, beijou a filha dos outros. Disse-lhe, com ciúme, o nome feio. E torceu-lhe o braço, até doer. Nunca pensou que sua namorada fosse filha de ninguém. Ele, o pai, humanamente lamentável, lamentavelmente humano. Ele, o pai, tem, agora, que olhar com o maior de todos os carinhos e sorrir-lhe um sorriso completo de bem-querer, para que ela, em nenhum momento, sinta que está sendo perdoada. Protegida, sim. Amada, muito mais. E, quando ela repetir que tem um namorado, dizer-lhe apenas:

- Queira bem a ele, minha filha.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Ana Rüsche


ANOTAÇÃO

esse amor demais vai acabar te matando, ana
escuta, presta atenção
vê se espreme esse coraçãozinho
pra ver se surgem um par de bolas embaixo
vai ser homem na vida
e para com isso, essa coisa toda,
essa bobageira

tem dias que a gente só quer
que nos tirem para dançar.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Aldir Blanc


VIDA NOTURNA

(Aldir Blanc)

Acendo um cigarro molhado de chuva até os ossos
E alguém me pede fogo – é um dos nossos
Eu sigo na chuva de mão no bolso e sorrio
Eu estou de bem comigo e isto é difícil

Eu tenho num bolso uma carta
Uma estúpida esponja de pó-de-arroz
E um retrato meu e dela

Que vale muito mais do que nós dois
Eu disse ao garçom que quero que ela morra
Olho as luas gêmeas dos faróis
E assobio, somos todos sós


Mas hoje eu estou de bem comigo
E isso é difícil
Ah, vida noturna
Eu sou a borboleta mais vadia
Na doce flor da tua hipocrisia

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Baudelaire


É necessário estar sempre bêbado.
Tudo se reduz a isso; eis o único problema.
Para não sentirdes o horrível fardo do Tempo, que vos abate e vos faz pender para a terra, é preciso que vos embriagueis sem cessar.
Mas de quê? De vinho, de poesia ou de virtude, a vossa escolha.
Contanto que vos embriagueis.
E, se algumas vezes, nos degraus de um palácio, na verde relva de um fosso, na desolada solidão do vosso quarto, despertardes, com a embriaguez já atenuada ou desaparecida, perguntai ao vento, à onda, à estrela, ao pássaro, ao relógio, a tudo o que foge, a tudo o que geme, a tudo o que rola, a tudo o que canta, a tudo o que fala, perguntai-lhes que horas são; e o vento, e a vaga, e a estrela, e o pássaro, e o relógio, hão de vos responder:
É hora de se embriagar!
Para não serdes os martirizados escravos do Tempo, embriagai-vos; embriagai-vos sem tréguas!
De vinho, de poesia ou de virtude, a vossa escolha.