quinta-feira, 19 de abril de 2012

Não vá dizer meu nome sem querer



Hoje o Rei faz 71 anos.Leiam o que Xico Sá escreveu.O Rei merece!


No natalício de Roberto, 71, uma breve interpretação de um dos seus maiores sucessos.

Não vá dizer meu nome sem querer à pessoa errada.

Está ai, nesse verso de Roberto e Erasmo, um dos maiores orgulhos da raça humana.

O orgulho macho do Sr. Detalhes.

Mais importante do que o chifre em si, amigo de infortúnio, seria a simples pronuncia do seu abençoado batismo.

Realmente um cara que zela pelo seu próprio nome na praça!

A vaidade é tão grande que o nosso personagem, um dos melhores da canção romântica brasileira, parte do pressuposto que qualquer outro rapaz, que não ele, é apenas a pessoa errada, o cavaleiro da triste figura troncha, nada mais.

Nem do outro cabeludo, que poderia aparecer na sua rua, o ciúme orgulhoso era tanto. Reza a lenda do velho Pasquim, aliás, que o cabeleira em questão teria sido o Tarso de Castro, escriba e macho de Passo Fundo, por supuesto.

Zero em modéstia e altruísmo, o Outro, o urso, o dom Ricardão de las Pontas, não passa de um coitadinho capaz de fazer a pequena lembrar do sr. dos detalhes tão pequenos.

Que cara convencido: não adianta nem tentar me esquecer, durante muito tempo em sua vida eu vou viver.

Apenas em um capítulo do conhecimento humano, a criatura esquece o pecado da soberba e reconhece que não é o pai da matéria. Sim, no caso dos erros do português ruim, naquele madrugador 1971 pós-reforma ortográfica, quando o professor Pasquale ainda em calças curtas afinava a sua singela lira.

Mesmo assim, amigo, repare, a falha é motivo de orgulho –o cara duvida que a “pessoa errada” pise e maltrate mais a língua pátria do que ele.

Haja pabulagem, uma tonelada de amor próprio, caminhões e mais caminhões de auto-estima ladeira arriba.

Há quem diga que é a melhor música do Roberto. Certamente é uma das mais representativas. Eu prefiro “O divã”, aquela das recordações que me matam, espécie de biografia de nós todos, esses moços, pobres moços interioranos dos Cachoeiros dos Itapemerins, das Guaratinguetás, dos Cratos, das Araraquaras, das Uberabas.

É, relembro a casa com varanda, muitas flores na janela, minha mãe lá dentro dela, me dizia num sorriso, mas na lágrima um aviso, pra que eu tivesse cuidado, na partida pro futuro, eu ainda era puro, mas num beijo disse adeus.

Professor titular da disciplina Educação Sentimental do brasileiro, cada um tem o seu Roberto preferido. Qual o seu, por acaso?

Eu só sei que vou deixar de pensar em você para prestar atenção na estrada.


http://xicosa.blogfolha.uol.com.br/2012/04/19/nao-va-dizer-meu-nome-sem-querer/


Tempo, tempo mano velho


Tempo, tempo mano velho

Envelhecer tem sido uma epifania. Uma boniteza, uma calma, uma preguiça de urgências, corridas, descompassos, mapas. Compreende-se candura, desapego, o valor de um não e as tardes chuvosas em que falta luz. Alargam-se as estantes, o coração esparrama um pouco pelas frestras das cicatrizes. Estas, se acomodam melhor. Procura-se menos. Mas ainda é possível sair sem grana e voltar bêbado, deixar o coração em casa e volver apaixonado. Envelhecer não cansa, expande, apavora, enaltece. E cada um de nós invariavelmente se transforma exatamente no que é.


CRISTIANE LISBOA

domingo, 15 de abril de 2012

ANGELA MELIM


COISAS ASSIM PARDAS

Para Eduardo


Canário-da-terra, marreco, chinfrim
coisas assim, nomes – Rita
coisas assim pardas, mestiças
de pequeno porte
coisas de fibra
embora os jeitos desvalidos
coisas pardas vivas
pulsantes
um poema assim.


Do livro Das tripas coração, Florianópolis, 1978