quinta-feira, 11 de setembro de 2014

ROBERTO BOLAÑO

“Se tivesse que assaltar o banco mais vigiado da Europa e pudesse eleger livremente meus companheiros de malfeitorias, sem dúvida escolheria um grupo de cinco poetas. Cinco poetas verdadeiros, apolíneos ou dionisíacos, tanto faz, mas verdadeiros, quer dizer, com um destino de poetas e com uma vida de poetas. Não há ninguém no mundo mais valente que eles. Não há ninguém no mundo que encare o desastre com maior dignidade e lucidez. São, em aparência, débeis, leitores de Guido Cavalcanti e de Arnaut Daniel, leitores do desertor Arquíloco que atravessou um campo de ossos, e trabalham no vazio da palavra, como astronautas perdidos em planetas sem saída possível, num deserto onde não há leitores nem editores, só construções verbais ou canções idiotas cantadas não por homens mas por fantasmas. No grêmio dos escritores são a joia maior e menos cobiçada. Quando um enlouquecido jovem de dezesseis ou dezessete anos decide ser poeta, é desastre familiar com certeza. Judeu homossexual, meio negro, meio bolchevique, a Sibéria do seu desterro só cobre de opróbio também sua família: os leitores de Baudelaire não se dão bem no ensino médio, nem com seus companheiros de classe nem muito menos com seus professores. Sua fragilidade, no entanto, é enganosa. Também seu humor e as manifestações caprichosas do seu amor. Por trás dessas sombras vagas se encontram talvez os tipos mais duros do mundo e seguramente os mais valentes. Não por nada descendem de Orfeu, que marcava a cadência de remo dos Argonautas e que desceu ao inferno e voltou a subir, menos vivo que antes da façanha, mas vivo ao fim e ao cabo. Se tivesse que assaltar o banco mais protegido da América, no meu bando só haveria poetas. O assalto terminaria, provavelmente, de forma desastrosa, mas seria bonito.”

ROBERTO BOLAÑO, 1999

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