quinta-feira, 15 de julho de 2010

velhas variações sobre a produção contemporânea


Agora mesmo algum maluco
deve estar postando qualquer treco
genial na internet,
alguém deve estar pensando
em como melhorar aquele
texto enquanto lota o especial
de vinagrete, perseguindo
obstinadamente um acorde
voltando da padaria.

Agora mesmo alguém
pode estar pensando
que guardamos só pra gente
o lado ruim das coisas lindas –
assim, trancafiado a sete chaves
de carinho – alguém
pode estar sentindo tudo ao mesmo tempo
sozinho, assim brutalmente
sentimental, feito coubesse
toda a dignidade humana
num abraço tímido.

Agora mesmo alguém deve estar limpando
cuidadosamente o CD com a camisa,
pulando a ponta do pão pullman,
sentindo o baque da privada gelada,
perguntando quanto está o metro
daquela corda de nylon, trepando
no carro, empurrando o filho
no balanço com uma mão
e na outra equilibrando
a lata e o cigarro, agora mesmo
alguém deve estar voltando,
alguém deve estar indo,
alguém deve estar gritando feito um louco
para um outro alguém
que não deve estar ouvindo.

Agora mesmo alguém
pode estar encontrando sem querer
o que há muito já nem era procurado,
alguém no quinto sono
deve estar virando para o outro lado,
alguém, agora mesmo, no café da manhã
deve estar pensando em outras coisas
enquanto a vista displicentemente lê
os ingredientes do Toddy.

Marcelo Montenegro

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